Cardeal Sergio da Rocha, arcebispo de Brasília e presidente da CNBB, assina artigo publicado no jornal Folha de S.Paulo, na última quarta-feira, 14 de fevereiro, tratando do tema da Campanha da Fraternidade deste ano: “Fraternidade e superação da violência”.
Leia o artigo
Construir a fraternidade e a cultura da paz, da reconciliação e da justiça é o objetivo da Campanha da Fraternidade deste ano, que lançamos nesta quarta (14). Seu tema é “Fraternidade e superação da violência”, com o lema de inspiração bíblica “Vós sois todos irmãos” extraído do capítulo 23 do evangelho de São Mateus.
A realidade da violência, com suas múltiplas faces, tem se revelado cada vez mais cruel e assustadora, duramente sentida pela população brasileira e cotidianamente estampada pela mídia.
A vida e a dignidade das pessoas e de grupos sociais mais vulneráveis são continuamente violadas de muitos modos. O assunto é urgente, não pode ser descuidado, nem deixado para depois. Requer a atenção e a participação de todos.
É possível superar a violência? O agravamento da situação, com a dificuldade de respostas justas, parece indicar a muitos que a resposta é negativa. A complexidade do problema, contudo, não pode levar à passividade e ao desânimo, nem a soluções equivocadas de cunho puramente emocional.
As reações de quem justifica a violência ou pretende combatê-la com mais violência são ainda piores. Precisamos pensar juntos sobre o seu significado e as suas causas para encontrar saídas condizentes com a dignidade humana e a ordem democrática.
A violência permeia também as práticas sociais. Dentre os seus múltiplos fatores está o contexto socioeconômico e cultural. A indignação diante da violência representada pelas situações de exclusão e negação dos direitos fundamentais, especialmente dos pobres e fragilizados, não pode ser menor do que a despertada por crimes bárbaros.
O investimento em segurança pública deveria ser acompanhado por gastos ainda maiores com o objetivo de assegurar condições de vida digna e os direitos fundamentais. A justiça social é o caminho para vencer a violência na cidade e no campo. A paz é fruto da justiça. Enquanto igreja, acreditamos que é possível, sim, superar a violência, em mutirão, cultivando parcerias e unindo as forças.
Como tarefa coletiva, necessita da atenção e dos esforços de todos, de acordo com os diversos graus de competência e responsabilidade. Há muito a ser feito por cada um, espontaneamente, nos ambientes em que vive superando, por exemplo, a agressividade e a intolerância nas redes sociais.
Embora seja importante a ação individual, também necessitamos de iniciativas comunitárias, com olhares atentos para as realidades local e nacional, ambas entrelaçadas. Se os temas trabalhados pela Campanha da Fraternidade exigem e conclamam a participação dos poderes públicos, isso é ainda mais verdadeiro neste ano, assim como é vital uma maior cooperação da sociedade civil organizada.
O ódio, a vingança e o fazer justiça pelas próprias mãos não são respostas; ao contrário, agravam ainda mais a realidade. A busca da justiça que conduz à paz não se faz por meio da violência. É motivo de esperança a defesa apaixonada da vida, da dignidade e dos direitos de toda e qualquer pessoa humana, testemunhada por muitos que acreditam na fraternidade e na paz.
A palavra de Jesus, “Vós sois todos irmãos”, lema desta Campanha da Fraternidade, nos desafia e anima a caminhar. É possível, sim, superar a violência e alcançar a paz construindo a fraternidade.
Cardeal Sergio da Rocha,
Arcebispo de Brasília, é presidente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB)
Fonte: CNBB