1. Todos os pronunciamentos doutrinários do Magistério da Igreja merecem um grande respeito
2. Nem todos os [ronunciamentos doutrinários do Magoistérios da Igreja envolvem no mesmo nível o seu carisma da infalibilidade
3. O mais alto grau de envolvimento do carisma da infalibilidade do Papa ocorre no seu ensinamento “ex cathedra”
4. O grau de envolvimento do carisma da infalibilidade nos pronunciamentos do Magistério comum do Papa é diversificado e depende da vontade do Papa e do objeto do ensinamento
a) A vontade do Papa
b) O objeto do ensinamento do Papa
Não se trata aqui do problema de qual é o papel que os diversos documentos de ensinamento do magistério da Igreja desempenham de fato na teologia; trata-se, no entanto, de estabelecer critérios para a avaliação do grau de envolvimento do carisma da infalibilidade. Sabe-se que por exemplo na encíclica Mystici Corporis Christi (1943) ou Mediator Dei (1947) o papa compromete mais a sua autoridade magisterial do que num discurso ao capítulo dos franciscanos, quando pronuncia algumas belas palavras sobre S. Francisco e estimula os seus filhos espirituais à pobreza. E é diferente a obrigatoriedade desses pronunciamentos.
O estabelecimento da posição doutrinária do valor do documento papal pode tornar-se muito necessário, principalmente quando apresenta exigências muito difíceis e exige a obediência (p. ex. a encíclica Humanae vitae).
Esse problema não foi até agora satisfatoriamente resolvido. No entanto, pode ser formulada uma série de afirmações já elaboradas pelos teólogos.
1. TODOS OS PRONUNCIAMENTOS DOUTRINÁRIOS DO MAGISTÉRIODA IGREJA MERECEM UM GRANDE RESPEITO
Independentemente do conteúdo e da forma dos pronunciamentos do magistério da Igreja, eles merecem respeito em razão de procederem de pessoas a quem Cristo recomendou de forma indireta (através de Pedro e dos apóstolos e pela convocação à função magisterial na Igreja) a função de fortalecer os irmãos na fé, e portanto a prestar serviço em torno da verdade da salvação. Não resta dúvida de que o papa com o concílio possuem a esse respeito a máxima autoridade, e por essa razão merecem a priori um grande respeito e crédito de confiança, mesmo quando ainda não conhecemos o conteúdo dos seus pronunciamentos.
“Os fiéis, conscientes da sua própria responsabilidade, são obrigados a cumprir com obediência cristã aquilo que os santos pastores, como representantes de Cristo, esclarecem como mestres da fé ou decidem como dirigentes da Igreja” (CDC, can. 212 § 1).
“Aqueles que se dedicam às santas ciências gozam da justa liberdade de pesquisa, bem como da prudente expressão da sua opinião nas questões em que são especialistas, mas com a observância da devida obediência à Função Magisterial da Igreja” (Ibid., can. 218).
O teólogo trabalha na comunidade da Igreja, como membro da comunidade da Igreja e para a comunidade da Igreja. Por isso, considerando a estrutura dessa comunidade, deve levar em conta a instância que pela sua função e pelo seu carisma estende o seu cuidado sobre a mensagem do Evangelho.
2. NEM TODOS OS PRONUNCIAMENTOS DOUTRI-NÁRIOS DO MAGISTÉRIO DA IGREJA ENVOLVEM NO MESMO NÍVEL O SEU CARISMA DA INFALIBILIDADE
Na história da cristalização dos pontos de vista a respeito desse assunto defrontamo-nos com posições muito extremas: uns gostariam de estreitar ao máximo a atuação do carisma da infalibilidade em nome da liberdade das pesquisas teológicas e da anunciação da Igreja; outros o ampliariam ao infinito. Antes do Concílio Vaticano I alguns teólogos e publicistas (L. Veillot, W. J. Warda) definiam todo documento papal, todo pronunciamento, todo ensinamento como infalível ex cathedra. Warda sonhava em poder ler nos jornais da manhã diretivas sempre novas e infalíveis do papa.
3. O MAIS ALTO GRAU DE ENVOLVIMENTO DO CARISMA DA INFALIBILIDADE DO PAPA OCORRE NO SEU ENSINAMENTO “EX CATHEDRA”
O papa se apresenta então com a sua autoridade máxima, o que enfatiza claramente, pronuncia-se em questões de fé e de costumes e faz isso com a intenção de obrigar toda a Igreja à obediência, sob pena das mais severas sanções. Isso não significa, evidentemene, que toda frase de um documento dogmatizante do papa se torna um artigo de fé. Tratamos disso em outro lugar.
4. O GRAU DE ENVOLVIMENTO DO CARISMA DA INFALIBILIDADE NOS PRONUNCIAMENTOS DO MAGIS-TÉRIO COMUM DO PAPA É DIVERSIFICADO E DEPENDE DA VONTADE DO PAPA E DO OBJETO DO ENSINAMENTO
A. A VONTADE DO PAPA
A vontade do papa pode ser conhecida:
1) Através das formulações claras, das quais resulta que o papa deseja envolver-se mais ou menos como mestre em questões de fé e de costumes.
2) Pela exigência da obediência. Em alguns pronunciamentos o papa insiste na aceitação da doutrina por ele apresentada, em outros não o faz, ou faz apenas uma menção discreta a esse respeito. Algumas vezes, ao exigir a submissão, impõe sanções pela falta de obediência em alguma questão. A gravidade dessas sanções depende da graduação doutinária dos pronunciamentos. Quando o papa impõe a sanção mais grave, ou seja, a exclusão da comunidade da Igreja (anathema sit), isso significa que ele envolve em grau muito elevado o seu carisma da infalibilidade.
3) Pela freqüência da apresentação de uma determinada doutrina. De uma forma devem ser avaliados pronunciamentos esporádicos, e de outra os ensinamentos freqüentemente repetidos. Pela sua repetição estes últimos tornam-se doutrina católica e podem atingir as qualificações de dogma de doutrina universal. Se por exemplo o teólogo deseja estabelecer a qualificação teológica da doutrina sobre a proibição de destruir a vida dos não nascidos, deve verificar se ela surgiu apenas recentemente, se se repete há muito tempo, ou ainda faz parte da doutrina constante do magistério.
4) Pela forma do pronunciamento. Mesmo num pronunciamento comum, por exemplo num discurso pelo rádio, o papa pode apresentar alguma verdade ou norma de procedimento importante, fazendo-o com grande autoridade. Cristo não relacionou a autoridade dos apóstolos com uma determinada forma do ensinamento deles, e portanto não subordinou o carisma da infalibilidade a uma ou outra forma de anunciação do bispo de Roma. Apesar disso a vida da Igreja estabeleceu que os ensinamentos mais importantes são apresentados pelo papa em documentos que consquistaram um significado maior, isto é, em encíclicas, bulas ou constituições apostólicas. Com isso os fiéis têm mais facilidade para fazer a avaliação. Por isso, nas tentativas de apresentação sintética da doutrina do papa ou dos papas a respeito de algum tema determinado não convém colocar lado a lado textos de bulas e de discursos das quartas-feiras, de constituições e de uma carta do papa a um grupo de romeiros poloneses. Quando se utilizam textos tão distantes entre si pela sua graduação, é preciso assinalar a sensível dissimilitude da sua importância teológica.
B. O OBJETO DO ENSINAMENTO DO PAPA
Para o teólogo não é uma questão indiferente o objeto a respeito do qual o papa se pronuncia. Com efeito, pode tratar-se de questões pertencentes de forma evidente ao âmbito da fé, por exemplo a importância da Eucaristia no anglicanismo, ao âmbito da moral, por exemplo a admissibilidade do protesto social armado contra a opressão e a injustiça drástica, ou ainda pode tratar-se de problemas apenas levemente relacionados com a fé e a moral, como por exemplo alguns tipos de sindicatos. No primeiro caso o magistério da Igreja deve possuir a grande autoridade do ensinamento da verdade para poder “fortalecer os irmãos na fé” de forma eficaz; no segundo, a resposta deve ser diferenciada. Não somos capazes de formular uma única resposta convincente. Parece que seria apropriada a seguinte formulação:
Em questões relacionadas apenas até certo ponto com a fé e a moral, a competência do magistério da Igreja depende (é proporcional) do grau do relacionamento das citadas questões com a área da fé e dos costumes.
Não se pode aceitar sem crítica a opinião de que, se o magistério da Igreja se pronuncia a respeito de alguma questão, isso significa que tem direito a isso, ou seja, ao solucionar algum problema, ipso facto afirma infalivelmente que tem autoridade para isso, ou – de outra forma – que a utilização do poder de ensinar identifica-se com a competência decorrente do carisma da infalibilidade. Dolorosos fatos históricos não permitem uma tal identificação. A Igreja algumas vezes pronunciou-se de facto a respeito de questões que não lhe diziam respeito, ainda que os papas julgassem que sim. Hoje nos envergonhamos dessas intervenções da Igreja. A condenação de certas teses científicas como sendo contrárias à Revelação mostrou ser simplesmente equivocada, prejudicial às pessoas, e comprovou quanta responsabilidade e dificuldade implicava o serviço da infalibilidade.
O teólogo deve incluir na sua oficina as seguintes publicações, que lhe facilitam o contato com a doutrina da Santa Sé:
Acta Sanctae Sedis (Roma) 1865-1908. Órgão oficial da Santa Sé (citado abreviadamente como ASS), que a partir de 1909 mudou o seu título para:
Acta Apostolicae Sedis (Roma) 1909 (citado abreviadamente como AAS).
L’Osservatore Romano (Vaticano) 1849.
Trechos de documentos em: DS e BF (segunda edição em 1988).
Após o Concílio Vaticano II as Congregações e Secretarias da Cúria Romana publicam os seus próprios boletins com rica documentação do âmbito da sua própria atividade; por exemplo a Secretaria para Assuntos da Unidade dos Cristãos publica a revista trimestral Service d’Information, em língua francesa e inglesa.