1. A cultura da fé
2. A sabedoria cristã
3. O serviço à Palavra de Deus
4. O serviço ao Povo de Deus
Ao indagarmos sobre os objetivos da teologia, apresentamos com isso o problema das funções que ela cumpre ou deve cumprir. Esses objetivos e essas funções distinguem-se de acordo com a maneira de entender a própria teologia, bem como das seções do seu conhecimento. Pressupondo certas simplificações, pode-se dizer que os objetivos da teologia entendida no seu conjunto são os seguintes:
1. A CULTURA DA FÉ
Por cultura costuma-se entender aquilo que o homem acrescenta à natureza, isto é, o conjunto do patrimônio material e espiritual da humanidade que enobrece a natureza. A teologia pode ser tratada igualmente como o conjunto do patrimônio do cristão crente, que procura compreender a fé cristã e viver com ela. Quando o cristão confessa “Creio, Senhor!”, ele expressa a sua fé; ainda não sabemos se é um teólogo. Quando o cristão sabe apresentar a razão da sua esperança (1P 3, 15), significa que é um teólogo, visto que possui a cultura da fé.
Aprendemos a teologia e a praticamos para que possamos responder fundamentadamente, diante de nós mesmos e dos outros, às perguntas: por que cremos, qual é a nossa fé, em que ela se baseia, como a conciliamos com o pensamento racional, com a filosofia e o desenvolvimento das ciências, por que como cristão eu vejo e avalio o mundo justamente dessa forma, por que assumo justamente essa posição em questões grandes e pequenas, o que constitui a marca essencial da fé e da moral cristãs, o que pode mudar na minha fé no meu código de procedimento e o que permanece como “imutável”, como responder às acusações apresentadas contra o Evangelho, a Igreja e sua história, como se apresenta a hierarquia cristã das verdades e dos valores? etc. Trata-se, portanto, de uma fé aprofundada, analisada, consciente, responsável, ou então – inteligente (de acordo com a definição tradicional da teologia como intelligentia fidei).
Sem esse tipo de cultura, facilmente e muitas vezes a fé descamba no fanatismo, na trivialidade, no ritualismo e no moralismo, em superstições e deformações, e diante das perguntas e acusações torna-se indefesa.
Seria um erro identificar a falta de estudos teológicos sistemáticos com falta da cultura da fé. Muitas vezes as chamadas pessoas simples, sem uma formação teológica formal, atingem uma alta cultura da sua fé: compreendem profundamente o Evangelho, sabem dar testemunho dele, viver segundo o Evangelho, e resolvem problemas difíceis, de forma espantosamente acertada, à luz da fé. Essas pessoas obtiveram a cultura da fé fora dos ambientes acadêmicos: no círculo familiar, onde florescia uma autêntica e profunda vida cristã, na leitura, em sermões inteligentes ouvidos com diligência, e finalmente em seu próprio pensamento e em sua vida pela fé, que são acompanhados pelo Espírito Santo com os dons da sabedoria, da inteligência, do conselho e do conhecimento (cf. Is 11, 2).
2. A SABEDORIA CRISTÃ
Toda a teologia serve à sabedoria cristã, mas existe em todos os períodos da história da Igreja uma nítida corrente da teologia sapiencial. No período patrístico essa corrente manifestou-se com muita nitidez nos centros de vida eremítica e monacal (nas famosas regras religiosas). A corrente sapiencial da teologia, relacionada com a filosofia neoplatônica, floresceu viçosamente na escola franciscana do século XIII, principalmente com S. Boaventura (com a sua famosa definição do objetivo da teologia: “para que sejamos bons e alcancemos a salvação” – ut boni fiamus et savemur), e antes ainda nos ambientes monásticos do século XII, principalmente com S. Bernardo (+1153). Ela se encontrava nas bases da piedade do século XIV via moderna e dos irmãos de vida comunitária, em cujo ambiente nasceu a Imitação de Cristo de Tomás de Kempis. Ela tomou a palavra nas correntes pietistas da Reforma como um protesto contra as intermináveis disputas doutrinárias e continua a se manifestar pelo protesto contra os excessos da especulação na teologia. De bom grado abrem-se a ela as ordens religiosas de tradições místicas, bem como diversos grupos e comunidades que anseiam por uma vida cristã aprofundada.
A teologia sistemática na Universidade Católica de Lublin encontrou a sua expressão estrutural (a teologia ascética e mística permaneceu no âmbito da seção dogmática ou moral) e pessoal (o pe. A. Slomkowski lecionava teologia dogmática e ascese, e a teologia dogmática do pe. V. Granat possuía um nítido caráter sapiencial).
3. O SERVIÇO À PALAVRA DE DEUS
Deus encerrou a palavra da Sua Revelação na Bíblia, monumento de uma determinada cultura. Transmitiu-a nos acontecimentos da História da Salvação, mergulhados no contexto de determinadas culturas. A sua melhor expressão ocorreu em Jesus Cristo, filho de um determinado povo, homem para todos, e no entanto parcela de uma pequena coletividade.
O universalismo da Revelação exige que a Revelação divina seja transmitida às culturas sucessivas até o fim dos tempos. Deus necessita de teólogos, para que eles realizem as sucessivas encarnações da Sua Palavra revelada e salvadora em culturas diversas e em mutação. São eles que realizam a inculturação do Evangelho, o que foi percebido, aprovado e recomendado pelo Concílio Vaticano II.
A atualidade e a eficácia da Palavra de Deus apelam aos teólogos, para que eles a reinterpretem sempre à luz da história, da experiência cristã e dos sinais dos tempos, e com essa tríplice chave hermenêutica, mutante e viva, abrirem a Palavra d Deus para seus tempos.
4. O SERVIÇO AO POVO DE DEUS
A teologia serve ao Povo de Deus.
O teólogo trabalha suspenso entre a Palavra de Deus e a fé do Povo de Deus. Pela teologia ele constrói uma ponte entre a Revelação e o homem. Ele aproxima a Revelação do homem, apresenta à Revelação as perguntas do homem.
O teólogo desempenha a função específica de mediador entre Deus e os homens por exemplo prestando ajuda à missão magisterial e pastoral da Igreja.
Na sua doutrina oficial a Igreja se utiliza do trabalho dos teólogos. Isso se manifestou de maneira excepcionalmente espetacular durante o último concílio, no qual os peritos desempenharam um papel importantíssimo, inclusive como mestres dos padres conciliares, que aliás em sua grande maioria também eram teólogos. Verificou-se que a teologia se tornou o hálito indispensável da Igreja. A queda dos ensinamentos teológicos num determinado período da Igreja acarreta a decadência da doutrina e da pastoral da Igreja; o desenvolvimento da teologia eleva o nível da doutrina e da vida na Igreja.
Os teólogos servem à Igreja no cumprimento da sua função magisterial preparando candidatos ao sacerdócio, e nas faculdades de teologia, os futuros professores de teologia e bispos. Nessa função eles se tornam duplamente mestres, visto que formam mestres da teologia e da fé.
Os teólogos dedicados ao estudo parecem ser improdutivos para o apostolado. Na realidade em geral isso não acontece, visto que uma boa teoria sempre é prática, e dedicando-se a ela, o teólogo serve à prática de forma multiplicada.
Compreendendo o significado da teologia, desde a antiguidade a Igreja apreciou e apoiou o seu desenvolvimento, concedendo aos teólogos mais eminentes o estupendo título de “Doutores da Igreja”. Desde a Idade Média fundou universidades com faculdades de teologia. Desde o Concílio de Trento cuida que cada diocese possua o seu próprio seminário, recomendando que os professores de teologia sejam escolhidos com excepcional cuidado. O Concílio Vaticano II, enfatizando a verdade de que a Igreja é o Povo de Deus, encaminhou um ardente apelo aos cristãos leigos para que eles se engajassem mais plenamente na missão apostólica da Igreja. Eles também, e não apenas os teólogos e pastores religiosos, devem “esclarecer, defender e adaptar os princípios cristãos aos problemas da era moderna” (Decreto sobre o apostolado dos leigos, 6). Na prática isso significa uma convocação aos estudos teológicos. Os leigos interpretaram adequadamente o pensamento do Concílio e abarrotaram as faculdades de teologia, criando uma nova situação dentro da Igreja. Eles estão contribuindo para ampliar e dinamizar o serviço da teologia em prol do Povo de Deus.