Diocese de Anápolis

Diocese de Anápolis

Diocese de Anápolis

Não foram vocês que me escolheram – Ordenação sacerdotal 2009

16/08/2009

“Não foram vocês que me escolheram; fui eu que vos escolhi” (Jo 15, 16).

Queridos irmãos e irmãs em Cristo.

1. Este momento do início da homilia foi precedido pelo rito de Ordenação de particular expressão. Houve um diálogo entre a Igreja e os candidatos à Ordenação.

O representante do Presbitério, ou seja, da Igreja hierárquica, convidou para que se apresentassem os que serão ordenados sacerdotes. Eles, um por um, do meio do povo, levantaram-se e, vindo até o Bispo, se declararam presentes. Em seguida, o mesmo representante da Igreja dirigiu-se ao Bispo e, chamando-o de pai, disse que a Santa Mãe Igreja pede que sejam ordenados presbíteros os irmãos que para isso foram chamados e que manifestaram a sua prontidão.

No diálogo acima há elementos essenciais para a compreensão do mistério da vocação sacerdotal na Igreja.

O sacerdócio é uma vocação, um chamado, uma iniciativa pessoal da parte de Deus. Há um insondável desígnio da vontade de Deus de atrair para si, entre o povo fiel, os escolhidos e chamá-los para uma convivência mais próxima de amigos.

A vocação, portanto, é um mistério da vontade de Deus que se manifesta pela voz da Igreja. A Igreja é o espaço, a expressão visível e o ponto de referência para uma válida e segura experiência de Deus. É um chamado pessoal, mas Deus o faz na Igreja e por meio da Igreja.

É um chamado livre, pois Deus sempre respeita a liberdade do homem, seja para um “sim” como para um “não”. Naturalmente, um “sim” a Deus é uma atitude de generosidade que, a exemplo de Maria, é capaz de produzir um enorme bem para a Igreja. Um “não”, sempre representaria algo que Deus não pode realizar a favor dos seus amados.

O vocacionado se levanta do meio do povo. É um sinal de enorme significado. Toda a experiência de Deus é feita no meio do povo e é expressão da fé de um povo. Toda experiência da vocação é carregada de vivência eclesial, independente das modalidades, dos caminhos pelos quais conduz para um despertar vocacional. Toda vocação é eclesial, antes de ser pessoal.

A vocação é um diálogo livre entre Deus, a Igreja e o interessado. Trata-se, pois, de felicidade que envolve uma pessoa concreta. Nada Deus quer que seja motivo de constrangimento, de frustração, de infelicidade.

A vocação é também uma iniciativa amorosa da parte do fiel. Alguém que ama e deseja fazer um bem. Muitas vezes é um prêmio de Deus ao desejo de ser bom, de passar a vida fazendo o bem, a exemplo de Jesus. O desejo que a própria natureza humana, inclinada para o bem, identifica com o serviço em prol da Igreja, do próximo, da caridade, na forma de vida sacerdotal.

Portanto, o dom do sacerdócio é fruto de amor, de desejo, de livre iniciativa, um pacto entre Deus, a Igreja e uma pessoa concreta e livre. Um dom e uma resposta ao povo, de quem Jesus continua tendo pena, pois parece como ovelhas sem pastor (cf. Mc 6, 34).

2. O sacerdócio é uma interrupção do divino na realidade humana, a presença do sagrado nas realidades temporais e profanas. “Todo sumo sacerdote é tomado do meio povo e representa o povo nas suas relações com Deus… (Hb 5, 1.). Deus deseja ser presente na sorte do homem. O homem precisa realizar a sua temporalidade com vistas ao horizonte infinito, realizar a sua vocação histórica com referências e parâmetros do sobrenatural, onde está a sua realização mais profunda e perfeita.

O sacerdote é homem do sagrado: “dote sagrada”, sinal de Deus e das coisas sobrenaturais no meio do mundo. A sua tarefa é servir ao povo espiritualmente, servindo-lhe a sabedoria da Palavra de Deus, santificando-o pela graça dos Sacramentos e da oração, promovendo o bem pelo amplo e generoso serviço da caridade.

3. O portador deste dom sagrado deve, portanto, sentir a consciência que não é um dom pessoal para o benefício exclusivo dele. O sacerdócio é, por natureza, um dom de Deus para o seu povo; dado ao indivíduo, mas a favor do povo. É, sim, para ele, o caminho da própria santificação, o espaço onde ele realiza a sua própria salvação. Porém, fica claro, que ele se santifica, não fechando-se ou limitando-se ao seu interesse pessoal, mas exercendo-o na disponibilidade para a Igreja, para o bem de todos, na forma e na intensidade das exigências pastorais, vivido na forma como a Igreja, hoje, aqui e agora, o exige, sem reservas, sem restrições, com total generosidade, atento sempre ao espírito de comunhão, no desejo de ser cada vez mais útil, despercebido no meio de tantos, contribuindo para a unidade, evitando todo particularismo e vontade própria. Assim Jesus formou seus Apóstolos e eles, embora com certa fatiga, acolheram e fielmente praticaram, até o derramamento de sangue. A desejo do sacerdote é de como ele pode ser útil para todo o conjunto da missão da Igreja, no sentido universal e diocesano.

4. Ser sacerdote bom é sentir-se envolvido na dinâmica missionária da Igreja. Quanta riqueza de reflexão e de orientação nos vem por parte do Santo Padre e da Igreja na América Latina. Penso, de modo especial no Ano Sacerdotal, proclamado em comemoração dos 150 anos da morte de São João Maria Vianney, padroeiro dos párocos, e, agora, proclamado padroeiro de todos os sacerdotes. O Santo Padre, no seu esmerado amor ao sacerdócio e aos sacerdotes, oferece-nos constantemente orientações para uma vivência renovada da graça sacerdotal, seja como vivência pessoal e santificadora da amizade com Jesus Cristo, seja como solicitude de um trabalho dedicado e criativo face aos desafios atuais da evangelização num mundo marcado pela cultura de relativismo, que considera a religião uma “paixão inútil”, de uma cultura de subjetivismo individualista, que põe no centro de tudo o próprio “eu”, uma cultura de niilismo, segundo o qual não há nada nem ninguém pelo qual vale a pena investir a vida inteira, uma cultura do útil e do imediato, que faz perder de vista o verdadeiro sentido da vida, uma cultura de pós-modernidade e de progresso científico e tecnológico, que fascina o ser humano, principalmente os jovens, mas não permite alcançar as camadas mais profundas da pessoa humana.

A Igreja na América Latina nos desafia com o apelo profético da Missão Continental, com o desejo de colocar toda a Igreja em estado permanente de missão, com a sua abordagem da vida cristã, inclusive de ministros ordenados, em termos de discipulado e missionariedade. Programar-se para ser sacerdote fora desses apelos é programar-se para um desserviço à Igreja. Trata-se de viver o sacerdócio de forma inteligente e comprometida, de forma renovada e profunda. Não é hora para as discussões. É hora de agir juntos, fazer o compromisso de unidade e comunhão apostólica, embora com possíveis perdas para as preferências pessoais. “Quem não está comigo é contra mim; e quem não recolhe comigo, espalha” (Lc 11, 23), dizia Jesus aos seus amados Apóstolos. Só a Igreja verdadeiramente unida será capaz de fazer frente aos desafios que se opõe de todos os lados ao frutuoso e eficiente apostolado em nossos tempos.

O nosso programa pastoral “Diocese em Missão” quer ser a nossa resposta a estes apelos da Igreja. Entrando, queridos candidatos ao sacerdócio, nas estruturas pastorais das nossas paróquias, lembrem que junto com o cultivo das formas da pastoral já comprovadas, é preciso ter espírito de maior solicitude e criatividade para com os afastados, com os batizados não evangelizados, batizados que se tornaram “neo-pagãos”. Dizia o Cardeal Dom Cláudio Hummes, Prefeito da Congregação para o Clero, na sua recente entrevista: “Devemos ajudar os sacerdotes a entender que já não basta esperar que as pessoas vão à paróquia. Hoje isso não é suficiente. É preciso que eles se levantem e vão buscar e evangelizar os batizados que se afastaram e todos aqueles que ainda não foram batizados. Que se deixem alcançar pelo sopro do Espírito Santo e comecem de novo a fazer a missão, no sentido estrito da palavra. Não podemos nos agarrar a um passado que não existe mais. Entender isso nos torna mais felizes, mais livres”. E na recente carta aos sacerdotes, o mesmo Cardeal escreve: “Não lançaremos a semente a Palavra de Deus apenas da janela de nossa casa paroquial, mas sairemos ao campo aberto da nossa sociedade, a começar pelos pobres, para chegar também às camadas e instituições sociais. Iremos visitar as famílias, todas as pessoas (…). Nosso povo quer sentir a proximidade da sua Igreja. Faremo-lo, indo à nossa sociedade com alegria e entusiasmo, certos da presença do Senhor conosco na missão e certos de que Ele baterá à porta dos corações aos quais O anunciarmos”.

5. É muito significativa a iniciativa do Santo Padre para indicar a figura de São João Maria Vianney como referência para um novo impulso de renovação sacerdotal. Ainda o Cardeal Cláudio Hummes nos diz: “Esse padre simples é um modelo exemplar: soube atrair a Cristo uma multidão de pessoas graças a sua vida, a seu modo de rezar, de ser padre, de confessar. Mesmo com todas as diferenças históricas e sociais que nos separam de sua época, precisamos lembrar que quando ele chegou a Ars, não entrava ninguém em sua paróquia. Depois, graças a seu estilo de vida, a suas homilias, aquela igreja se encheu”.

6. A figura do sacerdote, hoje, está como que em estado de foco de atenção por parte das forças que querem passar à opinião pública a imagem distorcida de sacerdócio católico, servindo-se, para isso, de ampla divulgação dos escândalos, às vezes verdadeiros, às vezes apenas supostos ou forjados. Sempre com a palavra do Dom Cláudio, queremos ponderar: “(O Ano Sacerdotal) é também oportunidade para restabelecer a verdade: 96 % dos sacerdotes do mundo inteiro não têm nada a ver com as várias formas de indignidade que apareceram nestes anos. A maior parte deles, mesmo com todas as fraquezas, os limites humanos, as faltas, oferece todos os dias sua vida pelos outros, no exercício cotidiano de seu ministério e de sua missão. Nós queremos ser positivos e propositivos com eles, ajudando-os a reforçar a vida espiritual, que sustenta todo tipo de missão. Este Ano Sacerdotal quer ser o reconhecimento da importância dos sacerdotes. Por que eles são tão importantes? Porque a Igreja caminha com os pés dos sacerdotes. Quando eles param, tudo para. Quando eles caminham, tudo começa a se mexer de novo”.

7. Queridos Diáconos, a vossa ordenação sacerdotal é motivo de alegria para todos nós e para a Igreja toda. Vocês são mais três colaboradores na ordem episcopal para a evangelização, santificação e salvação da nossa gente. Sejam bem-vindos no nosso Presbitério diocesano! Entrem com confiança e plena disponibilidade. Mobilizem todas as suas forças humanas e espirituais para, juntos com os demais sacerdotes e diáconos, realizar uma harmoniosa obra apostólica e missionária nesta Igreja particular. Não percam tempo nem energias com nada que não contribui para isso. Sejam fortes com a força da fé e da oração, de fidelidade diária aos compromissos decorrentes do estado clerical, cultivem o espírito de oração, principalmente por meio de leitura orante da Bíblia, vivam a espiritualidade do padre diocesano na atenta comunhão com o Bispo e com todo o Presbitério, e na presença, como fermento de espiritualidade no meio do povo, pratiquem a mística do sacerdote diocesano a partir da prática solícita de numerosas ocupações pastorais, especialmente no serviço da Palavra de Deus e dos Sacramentos e no acompanhamento das pastorais.

Deus lhes seja favorável!

Dom João Wilk, OFMConv.
Bispo de Anápolis

 

Rolar para cima