Somos tão exigentes com Deus, pedimos, imploramos, suplicamos… Exigimos tantas graças, confiamos tantos milagres, queremos aqui e agora. E nos esquecemos da realidade mais patente e visível: somos criaturas diante do Criador, pequenos e limitados, pobres e necessitados, que transformamos nossa condição de filhos de Deus numa ocasião e oportunidade para exigir e mandar, fazendo que nossa oração de humildes criaturas se transforme na mais absoluta e arrogante prece ditatorial. Diante desse coração empedernido de orgulho, falar de obediência para quem vê a Deus como um “garçom das graças” ou um “gênio da lâmpada dos milagres”, soará como uma violência à própria liberdade. Muitos pensarão que a obediência é coisa pra religiosos, padres e freiras, sentirão que a obediência é uma maneira de domínio opressor da Igreja, dirão que a obediência não respeita a liberdade ou é coisa para crianças. O fato é que a obediência nada mais é do que a forma mais simples para alcançar as graças que queremos, a maneira mais eficaz de demonstrar o nosso amor a Deus e de expressar nossa devida adesão a fé que professamos.
Hoje celebramos a Apresentação do Senhor no Templo, um mandamento vivido no seio do judaísmo (cfr. Exodo 13,1-15), que expressa consagração da descendência e o resgate dos primogênitos do povo frente ao Egito na última praga. Ao mesmo tempo, se oferecia sacrifícios para a purificação da mãe (cfr. Levítico 12) por causa do sangue no parto. Contudo, essa Lei apresentada não se encaixa na realidade da Sagrada Família: Jesus é o mesmo Deus, não precisaria ser consagrado; da mesma forma Maria teve um parto virginal, não precisaria de purificação, pois aquela que gerou “Deus conosco” não seria corrompida e nem se tornaria impura na sua entrega. No entanto vemos Maria e José subindo ao Templo para apresentar a Jesus, para consagrá-lo ao Senhor. A Sagrada Família é exemplo de obediência à vontade de Deus, mesmo sem necessitar, cumpre em si o que o Senhor pede, mesmo sem entender se entrega aos projetos de Deus. Tinha tudo para se achar mais importante, para exigir ou se exumar do cumprimento da Lei, mas na humildade do seu coração encarna o espírito de obediência e se torna exemplo para todas as famílias. Em uma época marcada por uma independência violenta, um egoísmo doentio e uma supervalorização pessoal, tempos em que a opinião de cada um se torna norma absoluta e inflexível frente aos demais, contemplamos a Sagrada Família seu espírito de fé, humildade e obediência. Não reclamaram e nem se revoltaram, apenas abraçaram com valentia e simplicidade aquilo que Deus Ihes ensinava. A obediência não é uma aniquilação existencial, mas é uma realização pessoal, pois como criaturas expressamos nossa real condição na medida que reconhecemos Deus como nosso Senhor. A obediência se torna a melhor maneira de deixar Deus ser Deus na nossa vida, expressar nosso amor, manifestar nossa confiança e ser quem devemos ser.
Jesus não veio para abolir a Lei, mas dar pleno cumprimento (cfr. Mt 5,17). De quem Jesus aprendeu a cumprir a lei? De seus pais, Maria e José. Foram eles que incutiram no Menino Deus o espírito de obediência, a humildade necessária e a entrega total. Na escola de Nazaré, a virtude mestra que une, reúne e guia é a obediência. Hoje celebramos também a Nossa Senhora da luz, que ela, como uma boa mãe, nos ensine que a luz que ilumina o caminho do céu é a obediência; e como uma boa mãe nos pegue pelas mãos para nos levar ao seu Filho Jesus; e se nós somos rebeldes, também como uma boa mãe, que nos pegue pelas orelhas e nos ensine a sermos obedientes a exemplo da Sagrada Família de Nazaré.
Pe. Carlito Bernardes Paróquia Divino Pai Eterno - Anápolis - GO Imagem: Reprodução/MBC