Uma das mais intrigantes situações do homem é sua constante busca pela felicidade em um contraste completo com sua limitada realidade de sofrimento. Almejamos o bem e nos precipitamos cotidianamente no mal; desejamos a alegria, mas vivemos chorando; fugimos do sofrimento, mas nos machucamos constantemente. A vida humana parece uma somatória de conceitos discrepantes e realidades contraditórias. Ansiamos uma resposta, uma verdade que dê sentido aos nossos dramas pessoais, uma realidade decodificadora que traduza as tramas da vida e dê clareza e deleite em viver.
À cruz de Cristo se torna esse instrumento decodificador da mais drástica situação humana, nela se reúne os conceitos mais discrepantes dando unidade e coerência: o sofrimento das chagas dá lugar à alegria do sentido salvífico; a morte de Cristo abre passo à vida nova do cristão, a tristeza da entrega é substituída pela felicidade da redenção, o desprezo de um condenado revela o mais autêntico e verdadeiro amor de Deus pela humanidade. O que para o homens é contradição, para Deus é união, purificação, redenção, salvação.
No diálogo com Nicodemos, Jesus explica a necessidade de ser elevado e como o Pai ama o mundo a ponto de entregar o seu Filho unigênito. À explicação de Jesus revela a sua consciência e compromisso com a missão, dá sentido à cruz que irá enfrentar, explica as entrelinhas da redenção. O grande diferencial do drama da cruz é o sentido que se dá, a cruz deixa de ser instrumento de tortura e se torna instrumento de amor a partir do momento que se dá um sentido de redenção e salvação.
Da mesma forma na vida de cada cristão, o drama humano da busca pela felicidade somente se encontra na leitura das entrelinhas da vida para vermos nossos sofrimentos e padecimentos como instrumentos de purificação e salvação, de crescimento e aprendizado. Por mais que a história da cruz seja antiga, sua vivência na vida de cada cristão ainda continua sendo um verdadeiro mistério: queremos Deus, mas não seus projetos, pedimos graças, mas não queremos trabalhar por elas; exigimos milagres, mas não fazemos por onde alcançá-los; buscamos respostas, mas não temos tempo para escutar a Deus. O sentido que se deve dar à nossa história somente se encontra numa conversa sincera, amorosa e atenta com Jesus. É Ele que nos faz compreender o sentido da nossa vida, o propósito dos nossos dramas, explica as entrelinhas da nossa história. Um Jesus crucificado que nos convida a olhar para Ele e nos enxergarmos junto a Ele na cruz de cada dia. Quando escutamos a Deus deixamos de questionar seus projetos, apenas vivemos, na certeza que o Senhor sempre quer o melhor para nós, que Ele não se esquece de nós (Salmo), Ele nos ama (2º leitura).
Nas entrelinhas da vida, num diálogo profundo com Jesus percebemos um plano que vai além das nossas seguranças, um projeto de amor e superação, um desígnio de salvação, redenção e elevação. Do sentido dado às nossas cruzes de cada dia, da leitura às entrelinhas da vida brota a alegria da conversão. Uma conversão que não é uma aniquilação pessoal, frustrada e desanimada, mas uma entrega livre, espontânea e coerente segundo a fé que se professa, segundo o bem que se almeja. Prostrados sob o peso das penitências, perseverantes nos propósitos quaresmais, relutantes na vida de santidade, vislumbramos o fim que nos enche de esperança e renova nossos ânimos.
Pe. Carlito Bernardes Oliveira Júnior Paróquia Divino Pai Eterno